7 de nov. de 2003

A covardia de Lula

Em mais uma de suas viagens, dessa vez para inaugurar terminal de passageiros do aeroporto de Campina Grande, o Presidente da República, em mais um de seus discursos improvisados, disparou: "Cheguei à Presidência da República para fazer as coisas que precisavam ser feitas neste país e que muitos presidentes, antes de mim, foram covardes e não tiveram coragem de fazer o que precisa ser feito."

A verborragia do detentor do cargo máximo da Nação revela arrogância ímpar, algo nada comparável àquele que durante boa parte de sua vida ostentou a imagem de humilde. Conforme suas palavras, Lula diz que foi eleito "para fazer as coisas que precisavam ser feitas neste país". O que seriam tais coisas? Inchar ainda mais o já esclerosado setor público federal, doando cargos públicos para políticos do PT e criando órgãos públicos inúteis só para dar emprego aos companheiros derrotados? Propor uma reforma tributária que resultará em mais aumento de impostos numa sociedade já saturada deles? Propor uma reforma previdenciária que pouco modificará nosso arraigado patrimonialismo e privilegialismo? Fazer viagens inúteis e dispendiosas aos cofres estatais, repetindo atos de seu antecessor, a quem tanto criticou pelos mesmos motivos? Foi para isso que Lula foi eleito, ou essas e outras atitudes apenas revelam que ele e o PT não possuíam programa de governo, e, no poder, apenas se mostram uma versão piorada de FHC?

À ocasião, Lula ainda chamou seus antecessores de covardes, porque "não tiveram coragem de fazer o que precisa ser feito". Esquecendo-se que um dia será ex-presidente, e que seus sucessores também terão vários motivos para criticar sua desastrosa administração, Lula critica os ex-presidentes por não terem feito aquilo que ele próprio não faz! Referia-se ele à questão da seca e da fome que aflige o Nordeste. "A seca é um fenômeno da natureza. A fome causada por ela, na verdade, é falta de vergonha dos homens que deveriam ter a responsabilidade de acabar com esse mal." O Presidente da República parece deslumbrado com o tal "Fome Zero", idealizado para ser instrumento de combate à fome, mas que até agora não passou de mera peça propagandística e de aliciação de eleitores. Até hoje, os políticos não resolveram o problema da fome no Nordeste, e certamente não será Lula que o resolverá. O discurso de Sua Excelência, além de revelar sua visão socialista de mundo, em que cabe aos burocratas acabar com os males que afligem a humanidade, incentiva as pessoas a esperarem que os políticos resolvam seus problemas, e não elas próprias. As comunidades pobres do semi-árido nordestino, que sofrem com a problemática da fome e da seca há tempos, em vez de se sujeitarem ao discurso demagógico e populista de Lula, devem arregaçar as mangas e, tendo por meio a cooperação e por fim a prosperidade, buscar elas próprias a superação das adversidades que assolam a região. No longínquo ano de 1880, quando da construção do Açude de Cedro, em Quixadá, Dom Pedro II já dizia: "Venderei a última jóia de minha coroa para que nenhum nordestino morra de fome!" De lá para cá, foram criados vários órgãos públicos - DNOCS, SUDENE etc. - destinados a combater as secas e a fome no Nordeste, e o que se viu foram poucas ações concretas, mas muita corrupção. O povo, que seria o beneficiado por aqueles órgãos burocráticos, acompanhou passivo às muitas denúncias de mau uso das verbas. Se órgãos públicos e leis resolvessem problemas, o Brasil seria país dos mais desenvolvidos, e a fome e a seca no Nordeste já teriam sido extintas há tempos.

Os dicionários conceituam covarde como o sujeito tímido, medroso, sem coragem. Pode-se acusar os antecessores de Lula de muitas coisas, menos disso. Covarde, na verdade, mostra-se o Presidente da República, ao não ter coragem de propor as reformas políticas e econômicas que o Brasil tanto precisa, ao ter feito promessas irrealizáveis quando em campanha, ao acusar seu antecessor de tê-lo legado "herança maldita" (ao mesmo tempo que nada faz para solucioná-la), e, principalmente, ao incutir na mente do povo, especialmente nos mais humildes, que devem eternamente esperar que políticos resolvam seus problemas. É isso que se espera de Lula, eleito afirmando que nossos problemas não eram resolvidos por falta de vontade política; para ele, bastaria editar leis e decretos e nossos problemas seriam extintos...

Observa-se, nos discursos de Lula, um tom messiânico. Ele, segundo ele mesmo, veio "para fazer as coisas que precisavam ser feitas". Considera-se o Messias que veio trazer a redenção e a salvação para o povo tupiniquim. Isso é conseqüência de anos e anos em que as esquerdas o protegeram - colocando-o a salvo de qualquer crítica - e mentiram sobre quem realmente ele era, transformando em "estadista", "o mais preparado" e outras qualificações sofísticas um sujeito que jamais se preocupou em estudar nossos problemas. Mimaram-no e bajularam-no demais, e Lula, hoje deslumbrado com o poder, não quer descer para a realidade. Caímos nesse conto-do-vigário, e Ruy Barbosa, de seu túmulo, repete: o Brasil tem os políticos que merece...

29 de out. de 2003

Críticas à Constituição

Em 5 de outubro último, a Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, completou 15 anos. Certamente haveria de ser uma data cívica, se a nossa Lei Maior não fosse tão desrespeitada, e, primordialmente, não fosse um documento político pouco prático.

Inspirada nos princípios da social-democracia (híbrido de capitalismo com socialismo, que, a exemplo do último, só funciona na teoria), a Constituição é hoje um calhamaço com 250 artigos - estes, por sua vez, divididos em outros tantos parágrafos, incisos e alíneas. Somados aos outros 89 inseridos nas "Disposições Constitucionais Transitórias", contam-se quase 350 artigos, que resultam em uma das constituições mais prolixas, minuciosas e detalhistas (analíticas, na terminologia jurídica) do mundo. Segundo o Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, há em nossa Carta Magna 48.381 palavras; na francesa 6.884, e na japonesa 4.661. Não bastasse isso, desde sua promulgação nossa Lei Maior já foi modificada 40 vezes, média de 1 emenda a cada 4,5 meses. E ainda tramitam no Congresso Nacional mais de 1.200 propostas de emenda. Comparando nossa Carta Magna com a norte-americana, de 1787, verifica-se que esta possui somente 7 artigos, que por sua vez são divididos em 21 seções, e desde então foi modificada apenas 27 vezes, média de 1 emenda a cada 8 anos. Esse "caráter temporário" da nossa Lei Maior revela imprudência dos constituintes de 1988, porque incapazes foram de compreender o espírito de pragmatismo e perenidade que deve nortear a elaboração de uma constituição. Uma anedota jurídico-política diz que certa pessoa dirigiu-se a uma livraria disposta a adquirir exemplar da Constituição; lá chegando, foi informada pelo livreiro que naquele estabelecimento não se vendiam periódicos...

Muitos daqueles quase 350 artigos inseridos na Lei Maior tratam de matéria não-constitucional, e por isso deveriam estar contidos em legislação ordinária. É o caso, por exemplo, do artigo 228, que afirma que menores de dezoito anos são penalmente inimputáveis. Tal preceito, pela sua própria natureza, não deveria estar inserido em uma constituição, e sim em um código penal. E mesmo a sociedade exigindo que menores de dezoito anos sejam penalizados por seus atos criminosos, a Constituição, que requer procedimentos mais formais e difíceis para ser modificada, rigidamente regulamentou aquela matéria, a exemplo de muitas outras que se encontram em seu texto, que tratam de temas alheios a uma constituição, como família, esporte, cultura etc. Decerto concluir-se-á, caso haja estudos, que a maioria das 40 emendas constitucionais até agora promulgadas modificou assuntos não-constitucionais, que, se estivessem contidos em leis infraconstitucionais, não teriam contribuído para o desgaste que nossa Carta Magna sofreu com a grande quantidade de emendas que teve.

Em que pese essa mancada de nossos políticos-constituintes, preocupados que estavam em abarrotar a Constituição de preceitos quantitativos e não qualitativos, a Carta Magna foi e continua sendo enaltecida. Porém, o que se observa é que muitos dos preceitos inseridos na Lei Maior, principalmente aqueles denominados "direitos sociais", não passam de alucinações teóricas. É o que se depreende ao analisarmos seu artigo 6o., que considera "direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados", significando que o Estado obriga-se a garantir esses "direitos" caso as pessoas não disponham de meios próprios de possuí-los. Em tese, se a turma não tiver dinheiro para comprar a bola de futebol, o Estado (por considerar o lazer um direito) obriga-se a garanti-lo. Esse exemplo justifica a existência dos inúmeros órgãos públicos (ministérios e secretarias, em níveis federal, estadual e municipal) com a finalidade de promover o esporte, pois é "dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um", consoante artigo 217. Eis outro ponto negativo da Constituição, o excessivo rol de "direitos", sem a respectiva contrapartida de "deveres". Cria-se a despesa, sem previsão de receita.

Uma Constituição deve ser um documento que restrinja e limite o poder político, que trate de sua forma e organização, que prescreva os direitos e garantias individuais e outros assuntos relacionados propriamente ao Estado. Deve ser a mais concisa e objetiva possível, para que seja útil à sociedade. Deve ser escrita por aqueles que pagam tributos, não por aqueles que vivem às custas deles. Aristóteles já advertia: "São prósperos os povos cuja legislação se deve aos filósofos". Aqui (ou alhures) ela se deve aos políticos, e o resultado foi uma Constituição que o tempo demonstrou ser muito teórica e pouco prática. Para o economista Roberto Campos, era a "Bíblia dos Demagogos"; para o jurista Celso Ribeiro Bastos, era um "Livro de Ficção Jurídica". Enquanto viger a Carta Magna de 1988, estes epítetos práticos prevalecerão sobre os epítetos teóricos de Ulisses Guimarães, para quem seria a "Constituição Cidadã" e a "Constituiçãodos Miseráveis".

20 de out. de 2003

Privilégios raciais

As “ações afirmativas” constituem uma série de “políticas compensatórias” exigidas por grupos de pressão politicamente corretos cujo objetivo seria reparar “injustiças históricas” sofridas pelos negros. Entre tais medidas, estariam a obrigatoriedade de ensino de história africana nas escolas, as indenizações aos descendentes de escravos e a adoção de cotas raciais em vestibulares e concursos públicos.

Um burocrata, incomodado porque estudantes se lixavam para história africana, promulgou lei tornando obrigatório seu ensino. Genocídios, canibalismo, mutilação feminina, ditadores cruéis etc. são fatos corriqueiros na história africana, mas é preciso maquiá-la, e por isso não serão ensinados. Ora, estudamos história por causa da cor da pele de seus agentes ou por sua importância para compreendermos o hoje? Estudamos gregos e romanos por serem a base da civilização ocidental ou por serem brancos? O estudo de história africana deveria ser proposto (e com argumentos), e não imposto (e sem argumentos).

As indenizações aos descendentes de escravos, se aprovadas, causariam correria a cartórios e genealogistas. Todo mundo querendo saber se teve ascendente escravo. O alto grau de mestiçagem do povo brasileiro faria com que boa parte dele recebesse indenizações, sem perceber que o próprio bolso as custeariam. Argumentam seus defensores que os brancos lucraram com a escravidão dos negros e estes hoje devem ser indenizados. Ora, minoria absoluta de brancos se beneficiou da escravidão negra. Que cobrem os descendentes desses beneficiados, se for justo responsabilizar um descendente por atos de seu ascendente, mormente tendo este praticado ato legal em seu tempo. Caso seja justo, e considerando que nas guerras tribais africanas era costume, anterior aos europeus, membros das tribos vencedoras escravizarem ou venderem aos traficantes de escravos membros das tribos derrotadas, que cobrem também os descendentes daqueles. Isso não é cogitado, como também não é cogitado que seja ensinado, nas aulas de história africana, que os negros foram escravizados pelos próprios negros, prática ainda comum na África.

Cotas raciais de no mínimo 20% (embora para o IBGE os negros sejam 5.39% da população) em concursos públicos e vestibulares devem ser adotadas, afirmam seus defensores, porque os negros ainda sentem os efeitos da escravidão e porque o “racismo camuflado” tupiniquim os impede de subirem na vida. Não são absurdas referências a “efeitos da escravidão” decorridos 115 anos da sua abolição? Quanto tempo será necessário? Também é incompreensível o que seria o “racismo camuflado” tupiniquim. O oposto disso seria o “racismo escancarado” que víamos nos EUA e África do Sul, em que brancos e negros viviam em bairros separados e se matavam entre si? Ora, então só existe “racismo escancarado”, não “racismo mascarado”, porque o racismo, para ser constatado, deve assumir formas exteriores, não interiores, estas só constatadas por entes sobrenaturais. Na falta de melhor argumentação, justificam o “racismo mascarado” porque negros têm médias de renda inferiores às dos brancos. De fato têm, mas diferenças de renda ntre “raças” podem ter causas diversas, não necessariamente racistas. Do contrário, já que os amarelos têm médias de renda superiores às dos brancos, estes podem acusar aqueles de racistas? E o preceito constitucional da isonomia, que afirma todos serem iguais perante a lei, sem distinções de qualquer natureza? Os “movimentos negros”, que durante décadas lutaram para vê-lo cumprido, são os mesmos que hoje exigem que ele seja violado. Alguns juristas até inventaram a expressão “discriminação positiva” para justificar tais estupros jurídicos, ignorando que, como conseqüência óbvia, os prejudicados abarrotarão (ainda mais) o poder judiciário com mandados de segurança, já que as autoridades responsáveis pela guarda e zelo da Constituição Federal até agora não se pronunciaram. Conclui-se que a adoção de cotas raciais (já o são em muitos lugares) trará danos à imagem dos negros, pois serão vistos pela sociedade como inferiores e incapazes de superarem as dificuldades da vida por mérito e esforço próprios. Ademais, quem se sentiria seguro em buscar serviços de profissional que entrou na universidade por causa de sua cor, não de sua competência? Em breve, obrigarão até a iniciativa privada a adotar cotas raciais, como ocorreu nos EUA (de onde as trouxeram), embora lá estejam sendo extintas.

Qualquer vantagem concedida a alguém com exclusão de outrem e contrária ao direito comum é privilégio, e qualquer política ou ação baseada em raça é racista. E a história não contém injustiças ou erros, sim fatos. Logo, é injusto, ilógico e irracional responsabilizar gerações atuais por fatos vivenciados por gerações passadas. Estamos importando problemas alheios, negando nossa cultura e destruindo nosso ethos, cujo exemplo maior é nossa boa convivência inter-racial.